Um estudo brasileiro feito por pesquisadores Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens/USP), publicado na revista científica American Journal of Preventive Medicine, mostra que, no Brasil, aproximadamente 57 mil mortes prematuras por ano — isto é, em pessoas de 30 a 69 anos — são atribuíveis ao consumo de alimentos ultraprocessados.
É a primeira vez que um estudo desenvolve e aplica um modelo de análise comparativa de risco para estimar as mortes totais atribuíveis ao consumo de alimentos ultraprocessados em um país a partir de dados nacionais de consumo alimentar, demografia e mortalidade.
A pesquisa brasileira foi feita com base no consumo nacional de alimentos para 2017–2018 e dados demográficos e de mortalidade para 2019. “As frações populacionais atribuíveis para mortalidade por todas as causas foram então estimadas dentro de cada sexo e estrato de idade de acordo com a distribuição da contribuição dos alimentos ultraprocessados para a energia total da dieta”, escreveram os autores sobre a metodologia do estudo.
Os pesquisadores concluíram que os alimentos ultraprocessados representavam de 13% a 21% da ingestão total de calorias diárias de adultos brasileiros na faixa etária estudada. O consumo deste tipo de comida é associado, em inúmeros estudos científicos, a um risco mais elevado de obesidade, doenças cardiovasculares, diabetes, vários tipos de câncer, depressão e perda cognitiva, entre outras doenças.
Em 2019, 541.160 pessoas com idades entre 30 e 69 anos morreram. Os cálculos feitos pelos pesquisadores apontam que aproximadamente 57 mil dessas mortes estão associadas ao consumo de alimentos ultraprocessados. Isso representa 10,5% de todas as mortes prematuras em adultos de 30 a 69 anos.
No estudo, os pesquisadores apontam que a redução de apenas 10% das calorias consumidas através de alimentos ultraprocessados na dieta diária dos adultos brasileiros seria capaz de poupar a vida de 5.900 pessoas. Já a redução de 50% da ingestão teria o potencial de evitar 29.300 mortes.
“O consumo de alimentos ultraprocessados representa uma importante causa de morte prematura no Brasil. A redução da ingestão de alimentos ultraprocessados promoveria ganhos substanciais em saúde para a população e deveria ser uma prioridade da política alimentar para reduzir a mortalidade prematura”, concluíram os autores no estudo.
O que são alimentos ultraprocessados?
Alimentos ultraprocessados são aqueles que passaram por inúmeros processos durante sua produção. Normalmente, eles contêm cinco ou mais ingredientes e foram preparados com aditivos alimentares para alterar o seu sabor, textura e cor ou para prolongar o seu prazo de validade.
Segundo o “Guia alimentar para a população brasileira”, do Ministério da Saúde, são alimentos ultraprocessados:
- Biscoitos, sorvetes e guloseimas;
- Bolos;
- Cereais matinais; barras de cereais;
- Sopas, macarrão e temperos “instantâneos”;
- Salgadinhos “de pacote”;
- Refrescos e refrigerantes;
- Achocolatados;
- Iogurtes e bebidas lácteas adoçadas;
- Bebidas energéticas;
- Caldos com sabor carne, frango ou de legumes;
- Maionese e outros molhos prontos;
- Produtos congelados e prontos para consumo (massas, pizzas, hambúrgueres, nuggets, salsichas, etc.);
- Pães de forma;
- Pães doces e produtos de panificação que possuem substâncias como gordura vegetal hidrogenada, açúcar e outros aditivos químicos.
O documento orienta evitar o consumo deste tipo de alimento. Dentre os motivos, destaca que os ultraprocessados “em geral, são pobres nutricionalmente e ricos em calorias, açúcar, gorduras, sal e aditivos químicos, com sabor realçado e maior prazo de validade”.
Alimento ‘viciante’
Estudos já comprovaram que os alimentos ultraprocessados “viciam” nosso cérebro e paladar. Isso ocorre principalmente por conta da presença de gorduras saturadas, açúcar e sal, ingredientes que deixam a comida mais saborosa e, consequentemente, nos vicia.
“Costumo dizer que isso ocorre, porque nós, humanos, tivemos um desenvolvimento evolutivo em que nosso cérebro se aperfeiçoou para tornar esses componentes da comida, especialmente, agradáveis para nós, porque não são fáceis de obter. Você tem que pensar que para nossos ancestrais, obter gorduras saturadas não era fácil, nem açúcar, nem sal. O que acontece hoje é que os encontramos em todos os lugares, então ficamos viciados nesses nutrientes, pois o cérebro está preparado para nos recompensar toda vez que os consumimos”, disse Javier Perona, pesquisador do Instituto de Gorduras do Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC) uma agência estatal espanhola, em entrevista ao jornal El Pais.
Fonte: O Globo