Puberdade, menstruação, vida sexual, desejos, orgasmo feminino, menopausa. Muitos temas referentes ao universo feminino ainda são cercados de tabus. E algumas fases são estigmatizadas ou tratadas com um certo deboche ou descaso. A menina ficou menstruada pela primeira vez? Ela virou mocinha! A mulher está nervosa? É TPM! Chegou na menopausa? Está velha.
Mas entrar na menopausa está longe de ser sinônimo de velhice. O corpo está envelhecendo? Sim. E isso não é uma sentença de morte. Essa fase faz parte dociclo natural da mulher, assim como a puberdade e a menstruação. Por isso, é preciso falar sobre o assunto.
“A menopausa remete à perda da juventude. A sociedade ocidental dá importância para beleza, juventude e a menopausa significa perda de fertilidade, que foi a principal função da mulher por séculos. Falamos sobre anticoncepção, mas não falamos sobre menopausa”, diz Lucia Helena Simões da Costa Paiva, vice-presidente da Comissão Especializada em Climatério da Febrasgo.
Dados do Estudo Brasileiro de Menopausa, realizado em 2022 com mais de 1.500 brasileiras, apontam que a idade média para entrar na menopausa no país é aos 48 anos. Mas é normal que ela aconteça entre 45 e 55 anos. Segundo o IBGE, a expectativa de vida das brasileiras é de 80,5 anos.
“Com o aumento da expectativa de vida, as mulheres terão mais de um terço de vida nessa fase. Se ela entrou na menopausa nos 50 anos e ela vai viver até 80, 90 anos, que ela viva bem, com qualidade de vida. Precisamos falar sobre o tema e desmistificar alguns pontos“, alerta Flávia Fairbanks, mestre e doutora em ginecologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Antes de falar sobre a menopausa, é preciso entender o que de fato significa essa fase. A menopausa faz parte do climatério — momento de transição da vida reprodutiva da mulher para a vida não-reprodutiva. É uma fase que tem início por volta dos 40 até os 55 anos e que engloba a perimenopausa, menopausa e pós-menopausa.
Climatério e suas fases
O climatério é todo o período de transição entre a fase reprodutiva e não-reprodutiva da mulher. Ele é dividido em três etapas: perimenopausa, menopausa e pós-menopausa. Entender cada momento é muito importante para tentar amenizar os sintomas e ter mais qualidade de vida.
- Perimenopausa: pode começar de 2 a 5 anos antes da menopausa. É quando começam a surgir os sintomas, como as ondas de calor;
- Menopausa: término da fase reprodutiva feminina, quando a mulher passa um ano sem menstruar;
- Pós-menopausa: como o nome já diz, é o período após a menopausa.
A perimenopausa é, então, a primeira fase. Nesta etapa já é possível fechar o diagnóstico, que é basicamente clínico, em uma conversa com a ginecologista. A paciente informa se está com a menstruação irregular, se está com dificuldades de dormir ou sentindo aquele calorão.
Durante a perimenopausa começa a queda do estrogênio, principal hormônio feminino produzido pelos ovários. Flávia Fairbanks exemplifica essa fase como um relógio que está parando de funcionar, mas não por completo. Isso porque mesmo com a queda acentuada do estrogênio, ainda é possível engravidar.
Quanto mais próxima da menopausa, mais a mulher vai sentir os sintomas se intensificarem.
“Isso ocorre porque os ovários estão parando de produzir os hormônios. Quanto mais próximo da menopausa, mais intenso eles ficam e duram de três a cinco anos. Depois, a tendência é que alguns sintomas diminuam, como os fogachos. Já outros podem piorar, com o ressecamento vaginal”, explica Lucia Helena Simões da Costa Paiva, vice-presidente da Comissão Especializada em Climatério da Febrasgo.
Os sintomas do climatério
As alterações hormonais afetam o bem-estar físico, emocional, mental e social. O estrogênio, que vai diminuindo nesta fase (até parar de vez), faz parte da regulação dos ciclos menstruais, contribui para a resistência óssea e influencia na temperatura corporal. Com os níveis alterados, os sintomas começam a surgir.
Os sintomas do climatério variam de pessoa para pessoa. Cerca de 80% das mulheres nessa fase vão apresentar sintomas, mas não significa que todas vão passar mal. Eles podem ser leves, moderados ou provocar um impacto alto no dia a dia.
“Os sintomas da síndrome do climatério são bastante característicos, como as ondas de calor, secura vaginal, qualidade do sono prejudicada. A mulher começa a ter um monte de coisa estranha e não associa a questões hormonais. E, na maioria das vezes, os sintomas estão relacionados com a falta de hormônio no organismo“, explica Flávia Fairbanks.
As mudanças e os cuidados no climatério
Já deu para entender que os hormônios são protagonistas em todas as fases da vida da mulher. Quando nasce, ela já tem dentro do ovário um número de folículos que serão gastos a cada menstruação. Essa reserva vai sendo usada até que uma hora acaba e ela não menstrua mais — a menopausa. Nessa hora, o ovário não está mais produzindo o estrogênio e a progesterona.
Lucia Helena explica que no organismo da mulher existem receptores dos hormônios que atuam no sistema nervoso central (SNC). A falta de estrogênio no SNC modifica os neurotransmissores e esse desbalanço hormonal desencadeia alterações no sono, humor, libido, ossos, coração. “Todo o lugar que tem receptor de estrogênio será danificado e será manifestado através de sintomas”.
E o que fazer para não ser atropelada pelos sintomas? Manter o estilo de vida mais saudável possível. Parece besteira, mas uma alimentação adequada, rica em cálcio e proteína, atividade física que a mulher goste e se identifique, terapia podem ajudar nessa transição.
“É fundamental não engordar nessa fase, porque o sobrepeso e a obesidade trazem uma série de outros complicadores que terão impacto na saúde em geral, com risco maior de hipertensão e diabetes, que são limitadores de uma série de ações para regular a menopausa”, alerta Fairbanks.
Além do estilo de vida, outras medidas também são indicadas, como a terapia de reposição hormonal, suplementação de cálcio e vitamina D (para os ossos), tratamentos não hormonais para controlar ondas de calor e medicamentos para os transtornos de humor.
Informação é essencial para enfrentar o período
Muitas mulheres acabam não identificando os sintomas do climatérioe, muitas vezes, isso é fruto da desinformação. Um levantamento feito pela Bigfral envolvendo mais de duas mil pessoas no Brasil apontou que 65% das entrevistadas só começaram a conversar com outras pessoas sobre o assunto quando sentiram os primeiros sintomas.
Sobre conversar com pessoas próximas, 12% optaram por não falar nada e um dos motivos é aquele citado no começo do texto: o medo de parecer velha. Outras alegações foram: medo de ouvir deboche, não achar necessidade ou vergonha.
Fairbanks lembra que as mulheres sempre são colocadas na posição de cuidadoras: cuidam da família, dos filhos, dos netos e não se colocam em prioridade.
“Se ela sabe o que é, identifica que está vivendo o climatério, ela vai ter as armas para combater os sintomas. Algumas medidas podem ajudar a chegar na menopausa com uma condição melhor. Os sintomas vão aparecer, não tem como evitar, mas se informar é muito importante“, completa Lucia Helena Simões.
A informação é aliada também para entender as mudanças nos desejos sexuais. Nessa transição do período reprodutivo para não-reprodutivo, é normal que as mulheres tenham uma diminuição na libido, secura vaginal e menos excitação.
“Os hormônios são responsáveis por boa parte da resposta sexual fisiológica. Se eles estão baixos, ela tem menos desejo, excitação, mais dificuldade em ter orgasmos. A parte da vagina, clitóris e vulva tem receptores hormonais”, diz Fairbanks.
As especialistas alertam que é fundamental que a mulher conheça seu corpo e seus desejos sexuais antes de entrar nessa fase. “Quando pensamos que 40% das mulheres já tinham problema com disfunção antes da menopausa, sobe para 85% nessa fase. Se ela não chegou bem nesse momento, quase certeza que vai piorar”, finaliza Flávia Fairbanks.
Fonte: G1