As mortes de figuras históricas por tuberculose – como o imperador Dom Pedro I, o inventor do alfabeto para portadores de deficiência visual, Louis Braille e o compositor Noel Rosa – fazem muitas pessoas acreditarem que essa é uma doença do passado. No entanto, ela continua sendo um importante problema de saúde pública nos dias atuais. De acordo com a base de dados final do Sistema de Informação sobre Mortalidade para o ano de 2021, publicada em maio de 2023 pelo Ministério da Saúde, 5.120 pessoas morreram de tuberculose no Brasil, o maior número de óbitos desde 2002, quando 5.162 faleceram.
Para evitar a ocorrência de óbitos por tuberculose, o diagnóstico precoce e o tratamento adequado são muito importantes. A doença tem cura e tanto o diagnóstico quanto o tratamento são oferecidos gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Contudo, a doença está ligada a determinantes sociais relacionados à pobreza e à exclusão social que podem dificultar a obtenção de informações sobre o tema.
As populações vulnerabilizadas com maior risco de adoecimento são consideradas prioritárias pelo Ministério da Saúde. Pessoas em situação de rua, por exemplo, possuem 54 vezes mais risco de adoecer do que a população geral. Já as pessoas privadas de liberdade, pessoas vivendo com HIV e povos indígenas possuem, respectivamente, 23, 19 e três vezes mais risco de adoecer do que a população geral. Ambientes fechados, mal ventilados, com ausência de luz solar e com aglomeração de pessoas são fatores que aumentam a chance de transmissão. Vale ressaltar, ainda, que a maioria dos óbitos por tuberculose registrados em 2021 – 64,6% – ocorreram em indivíduos pretos ou pardos.
Os serviços de saúde, ao identificarem pessoas com tuberculose em situação de vulnerabilidade, devem orientá-las a buscar os serviços da assistência social, especialmente o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), para avaliação das condicionalidades e posterior cadastramento para o acesso aos benefícios disponíveis. Os programas sociais melhoram as condições de vida desses pacientes e contribuem para a adesão ao tratamento, que deve ser feito até o final (o tratamento tem duração de seis meses), mesmo com o desaparecimento dos sintomas. Abandonar o tratamento pode agravar a doença e resultar no desenvolvimento de resistência aos antibióticos.
O Brasil faz parte dos países prioritários para o enfrentamento à doença, elencados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e está entre os 30 países do mundo com maior índice de transmissão. Desde 2017, o país segue um plano nacional, alinhado à Estratégia Global da OMS, com quatro fases de execução e duas metas principais até 2030: reduzir a incidência para menos de 10 casos por 100 mil habitantes e o número de mortes para menos de 230 óbitos por ano. Esses resultados representarão o fim da tuberculose como problema de saúde pública. Atualmente, o Brasil está na segunda fase de execução do plano.
O diagnóstico precoce é fundamental para o alcance dessas metas, pois permite o início do tratamento no tempo correto, ampliando as chances de cura, especialmente para a população mais vulnerável. Por isso, a partir de 2023, o Ministério da Saúde disponibilizou um novo teste de urina para o diagnóstico em pessoas vivendo com HIV com imunodepressão avançada.
Outra ação essencial para evitar casos graves é recuperar as altas coberturas da vacina BCG, que possui indicação de uma dose para recém-nascidos. Até 2018, esse índice se mantinha acima de 95%, meta estabelecida pelo Ministério da Saúde. Entretanto, a partir de 2019, a cobertura não ultrapassou os 88%. Para reverter esse cenário, a nova gestão do governo federal lançou o Movimento Nacional pela Vacinação, com o objetivo de fortalecer as ações de vacinação e resgatar a confiança da população nas vacinas.
A transmissão da tuberculose acontece por via respiratória, pela eliminação de pequenas partículas (chamadas de aerossóis) produzidas pela tosse, fala ou espirro de uma pessoa sem tratamento e com tuberculose ativa (pulmonar ou laríngea). O principal sintoma da tuberculose pulmonar é a tosse, que pode ser seca ou com catarro. Outros sintomas comuns são febre vespertina, (geralmente baixa), sudorese noturna e emagrecimento. Em caso de sintomas, é necessário procurar a unidade de saúde mais próxima da residência para avaliação e realização de exames.
CIEDS
De forma inédita, nove ministérios se reuniram para elaborar estratégias de eliminação de doenças que acometem, de forma mais intensa, as populações de maior vulnerabilidade social. O Comitê Interministerial para Eliminação da Tuberculose e Outras Doenças Determinadas Socialmente (CIEDS) foi instalado no início do mês de junho.
Coordenado pelo Ministério da Saúde, o grupo irá funcionar até janeiro de 2030. Dados da pasta apontam que, entre 2017 e 2021, as doenças determinadas socialmente foram responsáveis pela morte de mais de 59 mil pessoas no Brasil. O plano de trabalho inicial inclui enfrentar 11 dessas enfermidades – como malária, esquistossomose, Doença de Chagas e hepatites virais – além da transmissão vertical da sífilis, hepatite B e do HIV. Essa estratégia está prevista nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.
A meta é que a maioria dessas doenças sejam eliminadas como problema de saúde pública – são elas: Doença de Chagas, malária, hepatites virais, tracoma, filariose, esquistossomose, oncorcercose e geo-helmintíases. Para outras enfermidades, como tuberculose, HIV e hanseníase, o objetivo é atingir as metas operacionais de redução e controle propostas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) até 2030. Já para doenças como HIV, sífilis e hepatite B, a meta é eliminar a transmissão vertical, ou seja, quando a doença é passada de mãe para filho.
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, defende que a iniciativa é uma ação abraçada por todo o governo federal e, também, uma importante relação entre governo e sociedade civil. “Não é possível pensar o Ministério da Saúde sem abrir essa grande angular, para que nela possa caber um país com tantas desigualdades, mas também com tantas potências, como é o Brasil. Por isso estamos todos juntos. Essa agenda significa a possibilidade de eliminar doenças como problema de saúde pública, algumas, inclusive, históricas. Esse comitê busca reduzir as desigualdades, para que tenhamos, efetivamente, saúde para todos”, acredita.
A instalação do CIEDS é parte da premissa que garantir o acesso apenas ao tratamento em saúde não é suficiente para atingir essas metas. É preciso propor políticas públicas intersetoriais que sejam voltadas para a equidade em saúde e para a redução das desigualdades sociais, fator diretamente ligado às causas do problema.
Ministério da Saúde