Em diferentes momentos históricos, a ideia de fazer imigração para a Europa tem sido alimentada pelo anseio de uma vida melhor e pelo acesso a sistemas de saúde mais robustos. Desde meados do século XX, essa tendência tem moldado o caminho de muitas pessoas em busca de oportunidades e qualidade de vida. Na esteira dessas mudanças, a busca por um sistema de saúde mais eficiente se tornou um fator decisivo. No imaginário popular, países europeus são reconhecidos por seus sistemas de saúde e oferecem cuidados abrangentes e acessíveis. Mas será que na prática há uma melhora significa e um padrão de vida mais elevado?
Em uma recente entrevista, o renomado empresário e filantropo Bill Gates expressou sua admiração pela valorização do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. O cofundador da Microsoft elogiou os esforços do país em promover a saúde pública e destacou a importância do SUS como um pilar essencial no enfrentamento de desafios globais. Para dar uma visão geral de como funciona o Sistema público e privado de Portugal e sua diferença com o Brasil, o portal Olho na Saúde conversa com o advogado e residente de Lisboa há 05 anos, Marcos Viana, que nos traz uma visão geral do assunto.
1. Como está sistematizada a saúde em Lisboa/Portugal?
A saúde do país é sempre organizada de acordo com o modelo econômico que o país adota. Nos Estados Unidos, o modelo liberal não prevê a existência de uma cobertura de saúde pública gratuita. Então, você teve uma exceção, que é o governo democrata de Barack Obama, com um viés do que nós chamamos um pouco mais à esquerda , que embute programas de natureza social mais ampla.
No mais, é cada um produzindo e pagando o plano de saúde correspondente ao que ganha, embora você tenha o berço do liberalismo, que é a Inglaterra, e existe na Inglaterra um sistema nacional de saúde pensado em termos de assistência gratuita também para uma parcela da população.
Então, obviamente, quando você pergunta como é o sistema em Portugal, é um país que adotou a social democracia junto com políticas fortes no modelo europeu de constituição e construção do Estado social , que não é o socialismo previsto por economias fechadas de Estado forte e de concentração de partido único, mas em cima do modelo europeu que tem um sistema público chamado SNS (Serviço Nacional de Saúde) e promove uma perspectiva particular que difere do costume habitual, porque no Brasil existem planos de saúde, já aqui eles vendem o que chamam de seguro-saúde.
2. Há planos de saúde?
Existem planos, sim. Eles vão atendendo de acordo com critérios de doenças pré-existentes, idade e coberturas, porém aqui chama-se “seguro” – para exemplificar, você sabe que quando realiza o seguro de um carro, tem direito a três reboque por ano, o mesmo acontece no plano de saúde que eles aqui chamam de “paflão”: um grupo de procedimentos e de assistências previstas dentro do plano correspondentes ao valor que você paga mensalmente para ter esta cobertura. O lado positivo é que existe uma assistência ilimitada para ligações e conversar com o médico, além vídeo consulta, presencial, e vai ampliando as consultas das especialidades de acordo com o valor que você paga. Mas nem todo mundo consegue ter um acesso integral diante às questões financeiras.
3. O serviço de saúde pública funciona bem?
Isso também vai depender de alguns fatores, e eu gosto de abordar essas questões através do exemplo prático. Supondo que você mora em Pernambués, a quantidade de pessoas que tem no bairro é muito maior do que a que tem na Graça, e se você tem um centro de saúde em Pernambués, ele é muito mais sobrecarregado do que o da Graça, então tudo é escalonado de acordo com esse tipo de critério. Ou seja, quem mora na região maior pode até se queixar do serviço de saúde, já quem mora em áreas menores, vai dizer que o centro de saúde tem menos fila, menos confusão, o atendimento é mais prestativo, as instalações são mais limpas, tudo isso vai variar como varia para qualquer outro lugar.
Importante destacar que Portugal é um país inserido na comunidade europeia que tem 27 países, e Portugal talvez seja desses 27 o 21º em termos de condição financeira, ou seja, só existem seis países abaixo do país no que diz respeito à condição financeira. Portanto estamos num país pequeno com 10 milhões de habitantes, embora tem uma excelente rede hospitalar, tem uma carência de médicos muito grande, contando também com uma população idosa que requer mais serviços e atendimentos.
4. O médico da família é responsável por dar os primeiros encaminhamentos que devem ser destinados a outras especialidades?
Médico de família é um especialista em medicina interna, seria o que nós chamamos aí de clínico geral. Eu, minha mulher e meu filho temos médico de família porque demos sorte de estarmos num bairro onde a demanda por serviço não é tão grande, mas existem hoje no país quase um milhão de portugueses sem médico de família, 10% da população. Isso se deve ao fator econômico. Os médicos públicos recebem salários que não são compatíveis para uma vivência de luxo – acabam buscando oportunidades melhores e migram para a França, Inglaterra, Luxemburgo ou Suíça. São países que têm um custo de vida mais alto, mas a remuneração média para esses profissionais é quase o triplo da que se paga em Portugal, então você acaba ficando com menos médicos e profissionais de saúde no geral, como enfermeiros também.
5. Os brasileiros que aqui chegam encontram acesso com facilidade?
Qualquer pessoa que chega a Portugal se tem um problema emergencial pode acionar o serviço de saúde pública. Dirige-se ao hospital público ou pede socorro ao Instituto Nacional de Emergências Médicas – INEM ou Bombeiros. Há um documento chamado PB4 que o turista pode tirar e ser assistido durante a sua estadia. E o residente que lhe vem morar em Portugal deve tirar o Utente – que é o número do paciente que lhe acompanha por toda vida e que possui as informações do seu histórico médico e da sua saúde.
6. Como ter acesso à medicina especializada? É muito caro?
Para se ter uma ideia, uma consulta médica especializada em cardiologia gira em torno de 70 euros, ou seja, mais ou menos R$ 420,00. No Brasil há consultas mais caras e outras mais baratas, depende do médico, da sua especialidade. Há também a possibilidade de pagar por uma saúde privada com uma espécie de coparticipação. O paciente pode pagar mensalmente um valor e se precisar utilizar, acaba pagando uma consulta menor.
Aqui eu tenho um pequeno plano de saúde de seguro saúde chamado Medicare que pago 50 euros para três pessoas há cinco anos. Aqui eu costumo pagar 35 euros por consulta, tanto de cardiologia, como de oftalmologia, como de otorrino etc. Vale ressaltar que aqui não há uma segunda consulta de revisão, se você é atendido pela primeira vez e deseja mostrar que o remédio surtiu efeito, será creditado mais 35 euros, e se for a terceira vez, mais 35, não é igual ao Brasil que você tem duas consultas pelo preço de uma, então os exames saem mais caros.
7. Quais os serviços que você recomenda para brasileiros que residem aqui caso precisem rapidamente de uma urgência médica?
Eu sei que o seguro-saúde mais caro que tem em Portugal custa 400 euros, o que seria R$ 2.400. Fica complicado recomendar porque um plano privado tem boas coberturas, excelentes hospitais e depende da demanda de cada um, mas vale destacar que brasileiros que residem aqui podem tanto utilizar da assistência pública quanto pagar uma privada. Vai depender da condição financeira dele. Em todo o caso dispomos do SNS a exemplo do SUS no Brasil e de todos os outros serviços públicos já mencionados anteriormente.